20 junho, 2013

O quarto

Antoine acordou assustado, confuso por não conseguir enxergar.  Ficou um tempo deitado de costas tentando entender o que estava acontecendo.  O lençol arrancado na noite de sono violento estava enrolado em sua perna esquerda. Sua cabeça avisa que não era para estar escuro, alguma coisa tinha acontecido. Será que tinha acordado muito cedo e ainda era noite? Será que estava mesmo em sua casa? Perguntas que fez para seu leito do qual não obteve resposta. Sua pulsação começara a acelerar e, mesmo com o tempo passado, em nada o breu se dissipara. Não ouvia nenhum ruido vindo da rua. Onde estariam os carros, os ônibus matutinos, os bebados voltando pra casa e os trabalhadores para o serviço? Por onde andava aquele fervilhar urbano que o acordava todos os dias?


Antoine estava imerso no escuro e silêncio, sozinho com seus pensamentos. Chegou a cogitar se ainda estaria dormindo e que tudo aquilo não passasse de um sonho. Sentia uma opressão enorme comprimindo seu peito, uma tristeza imensa.


Começou  a pensar que a depressão era o estado natural do homem, afinal era só ter um pouco de senso crítico para perceber que nada valia a pena, tudo não passava de uma falsa sensação de importância em um mundo que nunca notaria a existência individual de cada um. Imaginou que o otimismo e felicidade eram proporcionados por alguma substância química liberada por alguma parte do corpo e que causava um entorpecimento das noções de realidade, mascarando tudo e tornando as coisas mais suportáveis. Ia além, imaginava essa substância como algo finito, assim como os óvulos femininos que nascem em uma determinada quantidade e são só aqueles durante a vida toda. Por isso teríamos uma felicidade maior nos anos mais novos e conforme avançamos na idade, a depressão começa a cobrar o seu espaço.


Antoine tinha total noção da insignificância de tudo, aquela sensação imensa de vazio que sentia no quarto escuro e silencioso ilustrava bem sua posição atual na vida. Não sabia por que levantar, para que sair daquela cama ou quarto.


-Foda-se, quero pelo menos descobrir o porquê dessa escuridão e silêncio.

Somente ao colidir com uma parede que não deveria existir quando tentou se levantar pelo lado contumáz que percebeu, Antoine não estava em seu quarto.

12 junho, 2013

Valeu Tio

- Valeu Tio.

A adolescente ainda estica o dedão para o céu antes de entrar no bar levando de carona o cigarro que acabei de acender.

- Tio é o seu cú - respondo imediatamente mas não tenho certeza de que ela chegou a escutar antes de entrar na porta abarrotada de jovens à qual ainda resolvi não enfrentar.

Você ouviu o que ela disse? - viro-me para minha namorada mas percebo que não está mais do meu lado, conversa animadamente com dois sujeitos da idade dela, um tem cara de estrangeiro e não me parece que está falando nossa língua. Escoro na lixeira metálica verde do meu lado e bebo o resto da lata de cerveja. Olho em volta e só tem um grupo de rapazes discutindo religião na minha frente, não vou me meter, acendo um cigarro e vou atrás de algo para beber. Olho para dentro do bar e não crio coragem, muita gente se atropelando na porta e mais uma fila enorme do lado de fora. Minha namorada continua conversando empolgada, resolvo andar até a loja de conveniência que não fica muito distante de onde estamos.

Passo por vários grupinhos que estão fumando maconha. Um dos adolescentes de um desses grupos me pede um cigarro, acendo e entrego a ele em troca de um pouco da vodka vagabunda que eles estão bebendo, dou um gole grande que me queima um pouco por dentro, alivio acendendo mais um cigarro.

Peço três latas de cerveja e um maço de cigarros, o rapaz da conveniência me atende antes dos outros moleques que se empurram pela janela da loja, nessa hora ser mais velho me ajuda um pouco.

Volto e minha namorada já não está mais conversando com os dois sujeitos, agora está com um grupo de duas meninas e um garoto. Quando chego abraçando-a por trás (instinto machista de demonstrar posse) vejo que uma das garotas é a menina que me chamou de tio. O assunto da roda é aventuras sexuais, fico mais a vontade e ofereço uma ceveja pra minha namorada e outra ao grupo. Minha namorada fala jogando os braços compridos dela para todos os lados, vejo que está tentando impressionar mas ainda não identifiquei quem, pode ser qualquer um do grupo ou de fora dele. Gosto de ouvi-la contando vantagem, enquanto todos usam histórias rápidas ela se extende em epopéias intermináveis. Ela sabe do que está falando, conta sobre suas peripécias com outras garotas, não me intrometo. Percebo que o único que está um pouco incomodado do grupo é o rapaz, deve ser menos experiente e fica calado. Eu também não falo nada mas por outro motivo, nesse assunto é melhor deixar as coisas correrem por conta própria, o que quer que diga vai atrapalhar a conversa, e isso eu não quero. Mesmo que minha namorada não esteja chamando o rapaz para a conversa percebo, por experiência, que é a ele quem está tentando impressionar, não posso censurá-la, até que o rapaz é bonito.

Confesso que, ao ouví-las falando sobre essas putarias todas acabo pensando em um menáge, mas essas coisas quem define é minha namorada, não vou me intrometer. Termino minha cerveja e resolvo enfrentar a multidão do bar, o grupo decide entrar também e vão na frente. Escuto alguns fragmentos da conversa de minha namorada com a menina-tio que demonstram que estão marcando alguma coisa pra mais tarde. Sorrio e pego forte na bunda de minha namorada que está com um short apertado, passo pelos dois rapazes com quem estava conversando e eles nos seguem com os olhos. Tio é o seu cú.