Alexey nunca havia se apaixonado antes, não dessa forma pelo menos.
Não era simpático aos cultivadores de amores platônicos e achava o
romantismo uma bobagem criada para vender livros de segunda e fazer
música ruim. Mesmo assim, com toda ojeriza que sentia pela futilidade do
interesse através da aparência, Alexey havia se apaixonado por uma
foto.
Percebeu o que estava acontecendo apenas quando
começou a acessar aquela imagem de 5 em 5 minutos alternando a tela do
seu computador através do teclado. Não conseguia mais trabalhar, sua
concentração estava inteiramente comprometida em esperar o próximo
atl+tab e rever aquele rosto. Era uma imagem comum e não diferia das
varias beldades disponíveis pela rede se não fosse um detalhe, a menina
da foto estava fazendo uma careta e, para Alexey, isso fazia toda a
diferença.
Conseguia entrever detalhes pela imagem, uma
tatuagem no pulso com o símbolo do ateismo, os olhos pintados e um quadro com guarda chuvas pendurado na
parede logo atrás. Conseguia construir algumas características através
dessas informações, mas o que o conquistou, o que realmente o fez perder
a cabeça foram as possibilidades. Alexey sabia que o que estava
sentindo era construído por essas possibilidades e forjado pela
admiração. Todos aqueles detalhes o intrigavam e o levavam a querer
conhecê-la mais e mais, e isso era o indício mais forte de paixão que
conhecia.
Dentro da sua cabeça teceu as imensas
possibilidades de personalidade e dos embates resultantes que os dois
teriam. Imaginou se algum dia contariam sua história entre risos,
regados de cervejas e cercados por amigos íntimos ainda
desconhecidos. Pensou que estariam todos em volta de uma mesa, a
abraçaria segurando firme com os dedos entrelaçados em seus cabelos, a
beijaria e diria para todos que se apaixonou a primeira vista apenas
pela foto de uma careta. Imaginou os países que visitariam, como seria a
família dela, das comidas que preparariam juntos enquanto bagunçavam a
cozinha. Pensou nos vinhos que tomariam, nas brigas que teriam e nas
pazes que fariam.
Porém algo gelava dentro de Alexey, ele percebeu algo mais, e isso lhe dava um puta medo, já tinha
experiência para saber que ela era o tipo de mulher de quem sentiria
ciúmes, por quem sofreria, alguém que o faria engolir todos os discursos
ideológicos de liberdade e racionalidade que sempre vomitou e defendeu. Alguém que o desestabilizaria e o arrancaria de sua confortável ilusão de independência.
Alternou
um pouco a tela tentando trabalhar mas o máximo que conseguiu foi parar
de pensar no futuro e se ater ao presente, começou a pensar se teria
namorado. Imaginou como devia ser seu dia a dia, quais os sonhos e os
dramas quotidianos que ocupavam aquela vida. Queria fazer parte daqueles
planos e problemas, ajuda-la a resolvê-los e levar alguns dos seus para
ela. Tremia por dentro somente com a ideia de tocar aquela pele feita
somente por pixels.
E assim foi dormir, com a imagem
daquela menina torcendo a cara vagando por sua mente. Dormiu sorrindo um
sono bom mas, no fundo, sabia que não passava de uma foto perdida na
internet, sem nenhum nome e nenhuma possibilidade de encontrar a dona
daquele rosto e poder ve-la fazer qualquer outro tipo de careta.
PS. (Alexey enviou esse conto em forma de carta. Como resposta conseguiu uma sequência linda e muda de fotos das mais variadas caretas, que só serviram para aumentar sua paixão e medo)