13 dezembro, 2007

O pacote

Então eu fico aqui, rastreando minhas encomendas através da internet. Ótima invenção essa, entro no sitio dos correios, coloco o código e posso saber exatamente como os produtos que pedi caminham tranqüilamente para minha casa. No momento tenho charutos de São Paulo e cervejas de Blumenau vindo em minha direção, vejo todo o seu percurso na tela do meu computador. Já comprei vários produtos de todo canto do Brasil, mas tem uma encomenda que foi internacional, e essa eu não recebi, despachei. Me lembro da emoção que foi aquilo, lembranças para alguém tão distante, pedaços de mim tão dolorosamente juntados e ali aglomerados, no fundo daquela caixa.

Com esperança enviei o pacote, pois dentro dele havia uma ajuda ao vício do destinatário, vício duramente interrompido pelo câmbio do país destino, por isso enviava com a caixa um pouquinho da minha doença. Mas não teve jeito, através do código percebo que o pacote chega em são paulo, demora alguns dias e toma o caminho inverso, retornando a mim. Não adianta, o pacote de cigarros não passou pela alfândega. Finjo ignorar as leis e me faço de assustado, pergunto para a atendente do correio se vou perder o dinheiro ou ainda posso utilizar a encomenda caso retire os cigarros e deixe o restante do conteúdo. Por sorte ela me libera e então troco os cigarros por mais um livro.

Agora sei que ele deve percorrer o caminho corretamente, não há nada mais de ilegal ali dentro. Acompanho emocionado o torto percurso que o pacote vai fazendo antes de chegar ao seu destino. Fico imaginando ela recebendo o aviso de que algo chegou, visualizo-a indo ate la, abrindo a caixa com dedos duvidosos, sorrindo saudades...

Mas algo acontece, ou melhor, não acontece. O sitio dos correios fica estático durante dias, sempre a mesma mensagem, aquele maldito aviso de que a encomenda chegou, nunca mudando para encomenda entregue. Demorei 3 semanas para perceber que a mulher que havia partido, a mulher que eu entreguei ao exterior, não existia mais. Ela havia ido além das fronteiras imaginadas e alcançáveis por mim.

Sentado neste computador eu fumo meus charutos paulistas e bebo minha cerveja blumenauense. O correio ficou caminho só de vinda, de mim não sai mais nada. Agora quase não me lembro mais das cartas de felicidades podres e livros de palavras velhas que devem estar mofando em um depósito frio e escuro, abandonado em um canto qualquer de um pais distante.



"Não me pergunte
Não me responda
Não me procure
E não se esconda
Não diga nada
Saiba de tudo
Fique calada
Me deixe mudo
Seja num canto
Seja num centro
Fique por fora
Fique por dentro
Seja o avesso
Seja a metade
Se for começo
Fique à vontade"

Walter Franco