28 dezembro, 2005

Romance Lusco-fusco

-Genoveva! Ah Genoveva! Minha miséria ofendia e excitava ao mesmo tempo tua educação burguesa. Minha casa suja com roupas, discos e livros jogados te interessava. Minha comida gordurosa e temperada agredia teu paladar refinado enquanto teu corpo sorvia bonito minha marginalidade.

-E os ratos, nossos voyeurs pestilentos? Te lembras dos ratos Genoveva? Tua agonia constante daquelas pequenas e rápidas coisinhas escuras que chispavam sombras pelos cantos da parede? O pior é que nem cama tinhas para subir. O máximo era o colchão jogado ao chão, suspenso por um estrado de madeira menor do que ele. Colchão este que parecia um obra abstrata com desenhos causados pelos mais variados flúidos corporais. Quadro que também ajudastes a pintar. Ah Genoveva, aquele tempo...

- Lembras Genoveva? Eu acabei com os ratos. Matei um a um com satisfação. Vã ilusão Genoveva. Achava que ias morar comigo. Abandonar o teu luxo pornográfico por nós. Esperei tanto Genoveva, mas agora...

- Mas agora Genoveva, foste embora. Cansou de mim e partiu, me chamou de covarde e disse que me traiu, bateu a porta na minha cara me mandando pra puta-que-o-pariu!

- É Genoveva... O que acalma um pouco a exaltação de meu ânimo é a impressão de que tua partida foi providencial.

- Genoveva, os ratos voltaram.

15 dezembro, 2005

Linhas pautas de uma canção dissonante de poucos e altos tons


O prazer que encontras e procuras no padecer
torna-se óbvio e vem de mim a resposta,
quando não encontro nenhum tipo de sofrer
nas rubras linhas que deixas em minhas costas.

13 dezembro, 2005

A Menina da Janela


Nunca estive tão longe da paz como naquele momento,
Onde o passado era uma ferida recente de onde escorria minha saudade
Apesar de tudo ou por causa disto você veio, subiu em minha janela e de lá me levou

Agora frí­volo e com a alma já entorpecida
Vago na noite mendigando fragmentos de sentimentos,
Aceitando a lúgubre assimilação de carí­cias distintas pela simples consequência da liberdade.
Essa fobia afasta qualquer possibilidade de proximidade
O aparecimento de pequenas certezas perturbam-me ainda mais
Deixando-me sufocado na agoniante aglomeração de caminhos não seguidos
Tateio meu futuro na tentativa de que alguma fresta se abra e
Minha retina se inunde com a luz que emana da paz que só tem aqueles que acharam o caminho certo a percorrer.

12 dezembro, 2005

O Enforcado

Mórbidas alternativas de inúteis sentimentos. Vis pagãos de fraca personalidade, dançam profanos em volta do fogo. O juramento foi feito, porém, ninguém se deu conta e a estranha realidade agora fez-se presente.
Os tortuosos caminhos acabaram por cruzar, trazendo à tona idéias em devaneios.
Ele busca um sentimento perdido que um dia teve. Sente falta das irresponsáveis emoções que o carregavam sem rumo por desconhecidas pairagens de medo e prazer.
-Impossí­vel! Já não é mais o mesmo homem.
O frio da lâmina busca o quente de seu sangue, o brilho da navalha chama sua atenção, a veia pulsa com mais força, quer rasgar-lhe a pele.
-NÃO!
-Covarde...
-Oh! Maldito meio termo.
Exclama enquanto chora por sua sina.
-Que estranho mundo composto de anônimos e perdidos personagens.
Concretiza suas faces em máscaras disformes e sem sentido, como em sua enorme e vazia existência. Alimenta a esperança que assim, talvez, seu medo passe.
-Idiota iludido.
Houve seu clamor os ecos da solidão. Afasta aqueles à quem quer pedir ajuda.
Outrora um leve sopro do remédio amenizava suas dores, hoje só aumenta.
As possibilidades de fuga vão se extinguindo.
Satisfaz o desejo...
E agora?
Vazio...
-Oh! Sonhada embriaguês.
Agora ele a espera. Mal sabe que ela não vem, desistiu.
Sua companhia agora é sua culpa, e não pode fazer nada contra isso...

09 dezembro, 2005

8 de dezembro de 2005 (como deveria ser)


Ela estranhava o próprio nervosismo, era acostumada a falar em público. Sentia um pequeno e incômodo nó na garganta e o suor das mãos que externava essa sensação atípica. Afinal era uma banca importante, o trabalho de um ano inteiro seria avaliado em minúcias. A preocupação não vinha da possibilidade de ser aprovada ou não, disso ela não tinha dúvidas. Como tudo em sua vida, ela tinha que impressionar, se surpreender. O que acharíam também não contava muito, ela possuía critérios próprios extremamente rigorosos, sua apresentação tinha que ser a melhor, pelo menos para ela.

No mesmo instante ele chegava ao aeroporto. Quase abandonou a bagagem para pegá-la depois, não poderia demorar ou perderia a apresentação. Toma um taxi as pressas e paga a mais para tentar chegar a tempo. O taxista esboça um sorriso de satisfação ante o pedido e voa.

No auditório todos já estão presentes, a família dela, dele, os amigos. Ela ainda alimenta uma pequena esperança, apesar de já saber que não vai ser possível. Então ele chega. Abre a porta esbaforido, preocupado que a apresentação tão esperada já tivesse começado, não queria perder nada. A banca, tão rigorosa em seus horários, abriu uma exceção para a linda cena que ocorreu. A saudade foi espremida dentro do abraço louco e tomada em um beijo sôfrego. O mundo parou por uns segundos em respeito.

Acordaram juntos, porem suas camas distavam 1.500 km. Ela ainda alimentou a esperança do sonho por mais tempo dirigindo-se a apresentação. Ele sentou na cama e chorou antes de ir trabalhar.

Obs. Ela arrasou na apresentação. A banca chorou. Parabéns princesa, botou pra foder.

05 dezembro, 2005

És meu rei senhor?


- És meu rei senhor?
A voz baixa e insegura provinha de um pequeno indigente que surgiu, não se sabe de onde, e prostrou-se ao seu lado com ar suplicante. Não devia Ter mais de oito anos e exalava um fétido odor de urina.
Transtornado por perder a linha de algum dispensável raciocí­nio e por sentir-se afrontado pela insistência dessas insuportáveis crianças pedintes que margeiam a vida e insistem em lembrar-nos da miséria em que vivemos e somos patrocinadores.
"Como se já não tivéssemos problemas suficientes em nossas vidas". Pensou.
- To sem dinheiro moleque, sai fora!
A malcheirosa boca contraiu-se e , timidamente, desceu o outrora radiante olhar. A baixa voz fez-se quase inaudí­vel.
- Não nobre senhor. Entendeste-me mal. Não é seu dinheiro que anseio. Preciso encontrar meu rei senão meu pai não me deixará voltar para casa, é derradeira minha chance. Por isso peço desculpas pelo transtorno causado a sua magní­fica pessoa, mas suplico: És meu rei senhor?
- Tá maluco! Cheirou cola moleque? Vai a merda e me deixa em paz. São cinco da manhã e tenho um puta dia de serviço pela frente.
Com um forte empurrão afastou-o dali. A criança titubeou um pouco, manteve os olhos baixos e sentou-se em outro banco do coletivo de onde começõu a fitar timidamente seu senhor.
Tentou voltar ao antigo raciocínio porém, como não lembrava qual era, procurou outro.
- Como sabes que não és o rei dele?
Agora quem o importunava era um ancião que estava sentado ao seu lado. Irritado esbravejou:
- Puta que o Pariu! Só tem louco nesse ônibus de merda?
- Loucura é uma questão de porcentagem. Pergunto-te, porque achas que tem dignidade o bastante para não ser seu rei?
Apesar de irritado, o senhor analisava confuso aquele velho com sua voz grave e rouca. Os dentes, visivelmente, eram poucos e estragados, seu rosto era coberto por profundas rugas. Apesar do deplorável visual, sua fala e seu penetrante olhar impunham respeito.
- De que merda está falando?
Indagou sem saber aonde o velho queria chegar.
- Acreditas realmente que um rei é dotado de atributos que o diferem tantos dos demais que o mesmo torne-se digno de idolatria José?
- Mas que porra é essa? Como ce sabe que meu nome é José?
- E porque não seria se tantos o são?
José agora estava mais confuso do que nunca, começou a observar mais atenciosamente o nebuloso ancião. O velho carregava vários livros e usava uma velha blusa de lã com a gola alta de onde saia seu fino e torto pescoço. Junto com o adunco nariz proporcionavam-lhe um aspecto rapineiro. Ele permanecia sentado sereno e curvado com as ossudas mãos sobre os livros onde José conseguia identificar apenas o tí­tulo: "O Espí­rito Subterrâneo".
- Rei prá mim só existe um, que é nosso Senhor Jesus Cristo que foi eleito por Deus. Nenhum rei feito pelo homem tem valor.
- Se não existem reis para ti José, porque segues fervorosamente a tantos e espera ansioso por outros mais?

30 novembro, 2005

married with children

There's no need for you to say you're sorry
Goodbye I'm going home
I don't care no more so don't you worry
Goodbye I'm going home

I hate the way that even though you
Know you're wrong you say you're right
I hate the books you read and all your friends
Your music's shite it keeps me up all night

There's no need for you to say you're sorry
Goodbye I'm going home
I don't care no more so don't you worry
Goodbye I'm going home

I hate the way that you are so sarcastic
And you're not very bright
You think that everything you've done's fantastic
Your music's shite it keeps me up all night

And it will be nice to be alone
For a week or two
But I know that I will be
Right back here with you

There's no need for you to say you're sorry
Goodbye I'm going home
I don't care no more so don't you worry
Goodbye I'm going home

Que merda

Ich bin ein Betrug

24 novembro, 2005

Realidade

Ela já perdêra a ilusão de que possuía qualidades únicas,
Todas as características que imaginava como exclusivas, suas rebelações, sua sensação de incompreensão e de deslocamento.
Ela percebeu que o mundo não foi feito nem pra ela nem pra ninguém,
Aprendêra que, tudo que ela imaginava particular, deveria transferir à todos, uma característica comum, pertencente ao coletivo.
Várias vezes falara aos outros sobre suas preocupações e anseios como se descrevesse a vida deles. A impressão que causara era impressionante: Uma adivinha! Como é que você sabe mais de mim que eu mesmo?
Em todo o tempo que ela adotou o costume nenhuma prova em contrário foi percebida
Por isso que ela sabe, todos são iguais, mais iguais ainda no que se imaginam diferentes.

Esse mundo não foi feito pra mim
Esse mundo não foi feito pra você
Esse mundo não foi feito pra ninguém.

Pra que foi feito esse mundo?
Ah meu rei! Se eu soubesse....