03 março, 2006

Da beira que se habita

Jaime ia em direção ao serviço pensando facas. Seguia seu costumeiro caminho que passava por um pequeno bosque enquanto se concentrava em tentar esquecer.

Sua mente estava torta, comum já que procedia uma ébria noite. Flashes de bizarros acontecimentos são disparados à todo momento e Jaime, inutilmente, tentava anulá-los.

Ele cantava músicas aleatoriamente para tentar não lembrar, falava sozinho, cada vez mais alto, tentando suplantar aquela voz irritante que berrava dentro dele e com quem, constantemente, discutia.

Apressa o passo, acha que com a velocidade poderia se afastar de seus fantasmas.

Falando sozinho e andando depressa, Jaime atraía olhares desconfiados. "Louco" sentenciam no bater do martelo comum feito da soma de seus medos. Vozes distantes o mediam. Vozes tão distantes e inúmeras quanto corretas, como sempre é a unanimidade. Vozes tão ridículas e inúteis quanto burras, como sempre é a unanimidade.

Jaime habitava a beira de um precipício vertiginoso e o vento emanado pelo forte hálito de suas não convicções o embalava e, perigosamente, aumentava. Ele percebia a iminência da loucura daquelas profundezas como algo tão palpável a ponto de sentir seu gosto. A clareza da realidade fugia ao seu senso de forma que as coisas e sensações não conseguiam adquirir a consistência suficiente para serem definidas como tais. Tudo era de matéria gelatinosa, tudo poderia desmanchar a qualquer momento. Toda a eternidade de sua vida (não se lembrava do começo, poderia não haver, existira sempre. E poderia não ter fim, nunca tinha morrido) poderia não ser nada.

Não interessa nada que não provenha dela, jaime agora, pensa dúvida. Sangra a boca de saudade e esvaece seus espectros. Sente sua presença de uma forma tão real que o assusta a ponto de procurá-la em volta.
Não queria pensar tanto nela, mas ele não é forte. Tudo que é está diferente perante ela. Sente vergonha do que foi, dessa eternidade insistente da noite passada.

Mas, pobre Jaime, ela nem sabe seu nome.

"...e cada qual no seu canto e cada canto sua dor..."

4 comentários:

Luiz Roberto Lins Almeida disse...

cara, o texto, como usual, tá bem narrado - nunca sei onde a 3ª pessoa se desvencilia da 1ª.
Além do mais, a foto tá mto bem trabalhada.
suerte

Anônimo disse...

Texto consistente e bem construído

Anônimo disse...

meu amor, eu tbm acho que vc nao merece.

Anônimo disse...

Viver à beira tem lá seus atrativos. E vira um belo conto!!!
Beijos